quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Reflexões: Relato de uma experiência interessante, durante meu estágio 5° periodo de Educação Física.

“Pesquisa de campo” com Catadores de Papel da ASMARE BH

Dia: 17/10/07 com Dona Neuza

Estávamos todos ansiosos por este dia, fomos um dos últimos grupos a fazer o que entitulamos, pesquisa de campo, mas que nada mais é do que um aprendizado mediante vivência da realidade, parecido com o quadro de programa de TV “Sentindo na Pelecomo é catar papel em Belo Horizonte.


O que segue neste relato, são as minhas interpretações do que presenciei durante as, aproximadas 3 horas que estivemos na companhia de D. Neuza. Cheguei as 18:00 hs na ASMARE BH, e fazia um calor insuportável, característico dos dias de meados de outubro e horário de verão. Fui recebida com um sorriso de D. Neuza, mas o que percebi é que ela também estava ansiosa com o encontro, andava de um lado para o outro e olhava o relógio a cada minuto. Como fui a primeira a chegar, ficamos sentadas em um banco, feito de cimento, em frente à ASMARE BH.

Ouvi suas confidências, informalmente, como quem conversa com alguém que conhece a pouco tempo, mas que deseja um laço amigável. Ela me contou sobre sua casa no Bairro Serra e da sua “ingenuidade” em manter uma ligação elétrica em sua residência, onde todos os vizinhos possuem os famosos “gatos” e do valor alto que se paga pela conta: R$ 100,00.

Me contou sobre um de seus filhos, e como quem desabafa com um profissional de educação física, falou da obesidade do mesmo. A justificativa, vem para evitar comentários: “Ele trabalha o dia todo, é muito ansioso e estuda a noite, não tem tempo para nada”.

Compartilhamos também o conhecimento, ou a ausência dele, sobre os recursos de aparelho de celular. A D. Neuza me mostrou que seu aparelho de celular continha algumas ligações as quais ela não sabia quem havia chamado. E eu, que tinha, um pré-conceito sobre catadores de papel e bens materiais, fiquei surpresa ao saber que ela tinha um celular!!! Besteira minha.

Bom, agora são 18:30h e começamos a caminhada, a Mércia e o Pedro nos alcançaram assim que atravessamos a Av. do Contorno. Apresentações à parte e logo veio um comentário da Mércia: - Núbia, ela é tão séria! Eu, como já estava mais tempo com ela respondi: - Não. É só tensão! Passa logo” E foi assim...


D. Neuza nos recebeu muito bem, disposta a responder sobre nossas curiosidades e dúvidas, pacientemente. Também, super preocupada com a nossa segurança no trânsito, afinal ver a cidade na perspectiva de um catador de papel, é algo novo para nós. Brincamos com ela sobre a “carteira de motorista” que o catadores tem, e da responsabilidade em transitar com segurança.

Presenciamos uma pequena divergência de opiniões, relacionada à uma atitude incorreta de uma outra catadora (não associada da ASMARE BH) que teimava em rasgar os sacos que estavam na rua deixando os mesmos furados e a cidade suja. D. Neuza se mostrou irritada e nos confessou: - O pessoal vai pensar que foi agente que fez bagunça e vai parar de ajudar. Enquanto ela (a outra catadora) fica com o melhor!

Passado esta cena, continuamos a caminhada; após algum trecho já percorrido, nós estávamos na Rua Carijós entre Av. Paraná e Rua Guarani, e também após olhares curiosos dos pedestres apressados, tentando entender a nossa presença participativa (como coadjuvantes) na peça da vida de D. Neuza (até então, quase não vista, conforme seu relato.

Paramos na Rua Carijós, esquina com Rua São Paulo e Av. Afonso Pena ela foi avisada que hoje teria muito “papel bom”, o papel branco (que é mais caro), ficamos esperando” eu só enxergava a mesma coisa, “sacos iguais”; mais D. Neuza com sua experiência garimpava, tateava e arremessava finalizando com uma sonora confirmação: Este tá bom.

O carrinho lotou, não cabia mais muita coisa, mais ainda restava outro ponto.

Então entrou em cena a experiência e o controle sobre aquele imenso e pesado carrinho (era isto que eu enxergava agora). Tentamos, Mércia e eu, abaixa-lo mais foi inútil. A força ou o jeito como prefere D. Neuza, nós não descobrimos como empregar.

Encerrada a coleta neste ponto, partimos para Av. Afonso Pena sentido Rodoviária. À esta altura, envolvidos com o trabalho, sugeríamos um ou outro papelão que víamos na rua. O engraçado foi ver o Pedro insistir com D. Neuza para que ela pegasse artigos de computador, e ela convicta de que “isso não presta”.

Rasgar caixas, forrar carrinho, acertar o alvo, foram apenas algumas das destrezas que ela nos mostrou com naturalidade enquanto ríamos das situações engraçadas acontecidas com ela. Um passageiro de ônibus que ao sair apressado do ônibus caiu dentro do carrinho; um saco de papel que teve o destino errado: a cabeça de uma transeunte.

E as horas passaram rapidamente, e aquele carrinho que parecia não caber mais nada, está agora parecendo uma montanha, ao qual somente com muita fé nós conseguiríamos transportá-la até a ASMARE BH.

Mas confiante e totalmente “Dona do Pedaço”, D. Neuza saiu puxando e nós, como uma “prole” acompanhamos a “mãe”. Nos propusemos a puxar, empurrar e direcionar o carrinho para abreviar a viagem.

E assim rumamos para a ASMARE BH, a cidade estava escura, mas ainda quente, o trânsito havia se acalmado e as pessoas estavam sumindo das ruas. O que víamos era um comboio de carrinhos e carregadores, alguns conhecidos de D. Neuza e portadores de um companheirismo nesta caminhada comum, outros somente companheiros de profissão.

Chegamos enfim! Nossas pernas estão “doces” e nosso cansaço é visível. D. Neuza não parou, colocou o carrinho lá dentro da ASMARE BH e correu para o banho, afinal ainda tinha um encontro com seu filho na Praça da Estação com destino ao seu lar, para um possível descanso.

Nós continuamos a observar a vida e agora de dentro da ASMARE. A cidade ASMARE BH dentro de outra cidade, Belo Horizonte. Engraçado foi que vi, lá dentro até as montanhas da Serra do Curral; só que estas montanhas são de papel e material reciclável.



Para finalizar ficamos em companhia de outras pessoas, conhecidas nossas lá Creche da UMEI Carlos Prates, onde estagiamos no 5º Período de Educação Física, supervisionados pela Professora Camila da Fundação Helena Antipoff (aliás esta pesquisa foi sugestão dela). E saboreamos uma sopa que uma Igreja oferece toda quarta-feira – uma delícia!

Agora, a música do Paralamas do Sucesso, não me sai da cabeça. Ela se parece bem com o que presenciamos ao lado de D. Neuza, ouvindo seus relatos. Os versos descrevem, como um fundo musical marcante:

“Todo dia o sol da manhã
vem e lhes desafia
traz do sonho pro mundo
quem já não o queria
(...)
E a cidade
(...)
lhes nega oportunidades
mostra a face dura do mal”
Com estes versos na cabeça, mas com uma vontade de cantar outros, de composição de Gonzaguinha (como os abaixo) eu desabafo:

“Eu sei, que a vida devia
ser bem melhor e será
mas não impede que eu repita
é bonita, é bonita, e é bonita”



Ah! Meu nome é Núbia Santos e foi assim que foi.
Depois dessa experiência não sou mais a mesma! Procuro sempre, quando vou ao centro de BH a D. Neuza para lhe falar um “oi”.

3 comentários:

Unknown disse...

Ei querida, passando pra deixar um grande beijo pra ti, votar no seu blogstar, e desejar uma otima semana...

Anônimo disse...

o que eu estava procurando, obrigado

Nubia Santos disse...

Que bom que minha experiência lhe foi útil. Fiquei curiosa com duas coisas: - Qual seu nome mesmo? E que procuravas? Um abraço, Núbia